Fuja de líderes “performáticos”

Fuja de líderes “performáticos”

             

No meio cristão, infelizmente, há muitos conceitos equivocadas acerca de quem é o Espírito Santo. Para alguns, é uma espécie de força “mística”. Outros O compreendem como um poder impessoal que Deus concede aos seguidores de Cristo. E o que diz a Bíblia a respeito da identidade do Espírito Santo? De forma concisa nos diz que o Espírito Santo é Deus, além de nos informar que é uma Pessoa, um Ser com mente, emoções e vontade.

Assim, o Espírito Santo toma decisões de acordo com Sua Vontade, como podemos ver claramente em I Coríntios 12:7-11. O versículo 11 em especial nos esclarece que o Espírito Santo opera todas essas coisas (os dons espirituais), repartindo particularmente a cada um como quer. Ou seja, o Espírito Santo é soberano e livre, agindo quando quer, como quer e onde quer.

E é aqui neste ponto que gostaria de tecer algumas considerações acerca de como esta liberdade que o Espírito Santo possui é frequentemente esquecida totalmente pelo que denomino de pastores “performáticos”.

Podemos dizer que performático é aquele líder que está à frente de algum tipo de show (como infelizmente viraram muitos cultos) ou de demonstração de habilidades para entreter ou suprir as necessidades das pessoas, uma espécie, de “artista natural”, considerando-se, nas palavras de Shakespeare, que: “o mundo inteiro é um palco.”

Mas, alguém pode estar se perguntando: Onde isso se insere no contexto cristão? O que ocorre é que infelizmente em vários cultos, o pastor é colocado como uma espécie de “popstar”, de “ungido do Senhor”, apto a usar de seus dons espirituais em “todas” as reuniões que comparece para trazer bênçãos a seus ouvintes, principalmente se possui um ministério destes específicos de cura ou profecias, que arrastam milhares de pessoas à igreja em uma fé do tipo utilitarista, onde a profecia e o milagre parecem ser muito mais importantes do que o próprio autor do milagre ou da benção.

Ou seja, a centralidade da pregação deixa de ser a Cruz de Cristo para se travestir de qualquer outra coisa.

Neste ponto, devo deixar claro que acredito, sim, que muitos pastores são usados nos nossos dias, com dons espirituais, pois acredito na contemporaneidade dos dons e não que eles cessaram com a igreja primitiva. Porém, penso ser um tanto questionável quando o uso destes dons passa a ser a tônica, o eixo central, de um ministério pastoral. É um prato cheio para aberrações, excessos e, não raramente, de charlatanismo e uso indevido do nome de Deus.

E por que penso desta forma? Exatamente porque acredito, como já mencionei, que o Espírito Santo é livre para agir quando quer, como quer e onde quer. Assim, se um destes pastores “performáticos” se propõem a fazer, digamos, 20 cultos em um mês, com anúncios antecipados de “grandes noites de curas milagrosas e profecias”, etc., como pode ele próprio (ou a igreja que o chama para pregar) afirmar que naquele dia específico haverá milagres e prodígios? Obviamente não há como. E aí começa-se a usar o nome de Deus em vão, sem qualquer espécie de temor.

Pastores que começaram sua jornada ardentes pelo amor a Cristo passam a agir com o passar dos anos como um ímpio que não tem temor e age de forma cínica. E se ele não para essa “roda viva” para refletir sobre o seu ministério, é porque muitas vezes não lhe caiu a ficha ou porque está mais preocupado com o fato de suas lotadas plateias voltarem para casa decepcionadas, achando que a “unção” não foi grande aquele dia. Ou seja, vaidade de vaidades, expressão que aparece, como nos esclarece Ed René Kivitz em seu livro sobre Eclesiastes (“O Livro Mais Mal-Humorado da Bíblia”), 35 vezes e que pode ser traduzida como inutilidade, futilidade, ausência de sentido, ou usando uma expressão de Haroldo Campos, “névoa de nada”.

Ressalte-se que muitos judeus preferem escrever apenas “D-us”, ou “D’us” ou ainda HaShem, para se referirem a Deus sem citar seu nome completo, em respeito ao terceiro mandamento recebido por Moisés pelo qual Deus teria ordenado que seu nome não fosse falado em vão.

Isto porque, no Judaísmo, cumpre-se o mandamento não escrevendo o nome de Deus em nada que possa ser consumido. Isto é, escrever o nome de Deus em um papel, o fogo pode consumi-lo.

Atente-se que não estou defendendo legalismos como estes dos judeus, que não fazem mais sentido no período de Graça, em que vivemos depois da vinda de Jesus, mas, acho bonito e significativo como símbolo de que devemos tomar muita precaução como cristãos ao citar o nome de Deus, pois Ele é Santo e não pode ser alguém que usamos para nossas conveniências pessoais.

Quando escrevo estas linhas, vem a minha mente a situação vivenciada por uma amiga, a qual a mãe tinha sido diagnosticada com um tumor cerebral, apesar de até então ter uma saúde inabalável. Assim, a mãe dela foi procurar um destes pastores “da unção”, fora de nossa igreja, sendo que este líder lhe disse que Deus estava lhe falando que ela seria curada com certeza de sua enfermidade. Mesmo diante disso, a genitora dela veio a óbito. E com ela, a “fé” da minha amiga, que ficou muito ferida com todo o episódio, caindo na descrença.

Hoje, como profissional, vejo minha amiga frequentemente, pois somos da mesma área, e fico me perguntando sozinho, sem respostas: Será que tudo aquilo poderia ter sido diferente?

Assim, temos que estar atentos para que em nossas igrejas não estejamos vivendo algo parecido com o que foi mostrado no filme LEAP OF FAITH, traduzido aqui no Brasil, como “Fé Demais Não Cheira Bem”, que é um filme de Hollywood, de 1992, estrelado por Steve Martin, que faz o papel do Reverendo Jonas Nightengale, um charlatão que promete milagres “em série” em troca das ofertas que recebe por doação.

O mais interessante é que no final do filme, seu ônibus quebra no meio do estado do Kansas, ele acaba reconhecendo os seus erros e um verdadeiro milagre acontece. É assim que vejo os milagres de Deus em nossas vidas, muitas vezes, sem qualquer programação, sem mandar “recado prévio” e espontâneo, sendo que o maior deles é a Salvação que Ele nos trouxe, sendo nós miseráveis pecadores.

Concluindo, temos que a expectativa de milagres em determinados ambientes eclesiásticos é tão intenso, que acabam criando uma dependência psicológica em muitas pessoas, dando espaço para cenas esdrúxulas e de pouquíssima sabedoria em ambientes onde pastores  como estes a que me referi pregam.

Neste ponto, o culto que deveria ser racional, como nos exorta a Bíblia, passa a ser muitas vezes um culto irracional, ou seja, algo que é feito instintivamente, focado apenas em emoções, arrepios e choros compulsivos, sem critérios ou razões que justifiquem. Em um culto assim é praticamente impossível se seguir o que está escrito: “Tudo, porém, seja feito com decência e ordem” (I Coríntios 14:40). Gnoticias